28 de março de 2011

O Ator


Por mais que as cruentas e inglórias

Batalhas do cotidiano

Tornem um homem duro ou cínico

O suficiente para fazê-lo indiferente

Às desgraças e alegrias coletivas,

Sempre haverá no seu coração,

Por minúsculo que seja,

Um recanto suave

Onde ele guarda ecos dos sons

De algum momento de amor já vivido.


Bendito seja

Quem souber dirigir-se

A esse homem

Que se deixou endurecer,

De forma a atingi-lo

No pequeno porém macio

Núcleo da sua sensibilidade.

E por aí despertá-lo,

Tirá-lo da apatia,

Essa grotesca

Forma de auto-destruição

A que por desencanto

Ou medo se sujeita.

E por aí inquietá-lo

E comovê-lo para

As lutas comuns da libertação.


O ator tem esse dom.

Ele tem o talento de atingir as pessoas

Nos pontos onde não existem defesas.

O ator, não o autor ou o diretor,

Tem esse dom.

Por isso o artista do teatro é o ator.

O público vai ao teatro por causa dele.

O autor e o diretor só são bons na medida

Em que dão margem a grandes interpretações.


Mas o ator deve se conscientizar

De que é um cristo da humanidade:

Seu talento é muito mais

Uma condenação do que uma dádiva.

Ele tem que saber que para ser

Um ator de verdade, vai ter que fazer

Mil e uma renúncias, mil e um sacrifícios.

É preciso coragem,

Muita humildade e, sobretudo,

Um transbordamento de amor fraterno

Para abdicar da própria personalidade

Em favor de seus personagens,

Com a única intenção de fazer

A sociedade entender

Que o ser humano não tem

Instintos e sensibilidades padronizados,

Como pretendem os hipócritas

Com seus códigos de ética.


Amo o ator

Nas suas alucinantes variações de humor,

Nas suas crises de euforia ou depressão.

Amo o ator no desespero de sua insegurança,

Quando ele, como viajor solitário,

Sem a bússola da fé ou da ideologia,

É obrigado a vagar pelos labirintos de sua mente

Procurando, no seu mais secreto íntimo,

Afinidades com as distorções de caráter

De seu personagem.


Amo o ator

Mais ainda quando,

Depois de tantos martírios,

Surge no palco com segurança,

Oferecendo seu corpo, sua voz,

Sua alma, sua sensibilidade

Para expor, sem nenhuma reserva,

Toda a fragilidade do ser humano

Reprimido, violentado.

Amo o ator por se emprestar inteiro

Para expor à platéia

Os aleijões da alma humana,

Com a única finalidade

De que o público

Se compreenda, se fortaleça

E caminhe no rumo

De um mundo melhor,

A ser construído

Pela harmonia e pelo amor.


Amo o ator

Consciente de que

A recompensa possível

Não é o dinheiro, nem o aplauso,

Mas a esperança de poder

Rir todos os risos

E chorar todos os prantos.

Amo o ator consciente de que,

No palco, cada palavra

E cada gesto são efêmeros,

Pois nada registra nem documenta

Sua grandeza.


Amo o ator e por ele amo o teatro.

Sei que é por ele que

O teatro é eterno

E jamais será superado

Por qualquer arte que

Se valha da técnica mecânica.


(Plínio Marcos)


Meu presente a vocês.

Dia 27 de março dia do Teatro.


Paulo Galrão.

7 comentários:

  1. Incrível esse texto!

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  2. Lindo...

    "Amo o ator...quando surge no palco com segurança,oferecendo seu corpo, sua voz,sua alma, sua sensibilidade..."

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Valeu Paulo! Lindo o texto! Quando vamos fazer uma peça dele?

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  5. Será que estou ficando louca ou o título do blog mudou? Já era esse antes?
    Se era, só agora reparei o quanto é bacana. Se não era, parabéns pra quem mudou.
    (des)construindo tudo! rs
    bjs

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  6. Parabéns pro Felipe... ahhahaha...

    Não era não marinha!

    Beijos

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